Estou presa nas cores de outro artista, procurando a porta que me leva de volta para o Jardim
Permaneço sentada no meio da sala. A cadeira é macia, muito confortável, um convite para o sonhar. Mas a calmaria do estofamento só acentua a velocidade do meu olhar em busca de um ponto de fuga. É evidente. Estou presa aqui. Meus pensamentos tateiam caminhos possíveis, a paisagem virou uma sequência de manchas de tinta e o máximo que vejo são vultos coloridos, que, inclusive, parecem estar rindo das minhas fantasias.

Calma. Respira. Segue o fio.
Não deve ser tão ruim. Ao menos é isso que tento pensar enquanto Fellini ecoa no meu vazio: “Um homem sem medo me parece que seja um estúpido”. Estou apenas aguçando alguma estratégia de sobrevivência.

Calma. Respira. Segue o fio.
Estou em um jogo. Impulsionar (coisas) por meio do medo não é uma novidade. Refletir o medo no espelho de aumento é um claro recurso de mobilização do outro. É que, por vezes, sou mais brincante que comunicadora, gosto de jogar. E acabo me esquecendo da aula sobre como Orson Welles deixou uma cidade em pânico. Baixo a guarda e desaprendo a desmontar esses mecanismos de medo fantasioso. Que bom. Ou não.

Calma. Respira. Segue o fio.
Muito pequena, observando as transgressões culturais que acontecem em um estádio de futebol, aprendi que os jogos têm suas próprias regras. Já velha, fui entender que a arte também é um campo de futebol. Nos dois casos, lidamos com o imaginário. Morin chamaria de segunda natureza do homem. Eu prefiro, Ivan Bystřina, que chama de segunda realidade. Agora, lascou. Não vai ser fácil passar de fase.

Calma. Respira. Segue o fio.
Vamos aos fatos. Estou embebida pelo texto, curadoria e expografia do Vilarejo 21. Preciso buscar algo que me aterre até esse acesso de ansiedade passar.
Esta não é uma sala qualquer. Estou na Galeria Trama. E as obras expostas são do artista Luis Jungmann Girafa. Tá explicado. Ele também é arquiteto, cineasta, fotógrafo, gosta de fotos nos livros, sabe editar histórias e construir narrativas visuais como ninguém. Esses corredores todos são como uma teia, em que cada fio foi perfeitamente posicionado.

Calma. Respira. Segue o fio.
Com uma fagulha de bravura me levantei e fui buscar um novo olhar para aquele diálogo nada sutil entre imagem e palavra. Seguindo o fio, encontrei a história. Mas ainda não sei se sou espectadora ou personagem. Saio da galeria com essa dúvida reverberando pinceladas fortes em mim.

Calma. Tem spoiler.
Se você não gosta de spoiler, pare sua leitura por aqui. Vou entregar o texto que encontrei seguindo o fio. Mas não vai ser tão simples assim. Você vai ter que ampliar as imagens, olhar tudo com mais calma. E, se você estiver em Brasília, por favor, coragem. Vá até lá conferir essa exposição pessoalmente. Será você capaz de escapar? Eu não fui.
Respira fundo. Tem gatilho.

SERVIÇO:
EXPO :: IMAGENS INTERROMPIDAS
ARTISTA :: LUIS JUNGMANN GIRAFA
TEXTO, CURADORIA E EXPOGRAFIA :: VILAREJO 21
REALIZAÇÃO: FUNDAÇÃO ATHOS BULCÃO
PRODUÇÃO :: MATÉRIA PLÁSTICA
APOIO :: PORTOBELLO
GALERIA :: TRAMA
ENDEREÇO :: FUNDAÇÃO ATHOS BULCÃO – CRS 510 BLOCO B
VISITAÇÃO :: ATÉ 02 DE SETEMBRO DE 2023
HORÁRIO :: SEG. À SEX, DAS 9H ÀS 18H – SÁB. DAS 9H ÀS 14H.
3 Responses
Mulher q coisa maravilhosa é o seu olhar é o seu texto!!!!! Escreve. Não para.
Linda leitura. Obrigada
obrigado pela sensibilidade do teu olhar