Minha mente em pedaços

Conheça a obra que tentei moldar e escapou entre meus dedos enquanto caminhava pela curva do rio seco

Processos sempre são intensos, por vezes, ainda mais. A verdade é que tenho me emocionado muito na execução de todos os trabalhos com o barro vermelho. Meu corpo seco ainda verte lágrimas. Minhas lágrimas é que umedecem as beiras do rio que insiste em secar.

E foi assim, com o coração apertado e chorando as dores do mundo, durante a produção da série Rio Seco, que hoje está,  em grande parte, exposta na minha individual no Espaço Cultural Renato Russo. Isso mesmo, lá onde o rio faz a curva.

Sigo caminhando por este rio seco sem saber exatamente o que vou encontrar. Mas já fiz a curva e não tem mais como voltar. O que vejo são mais curvas.

A produção da obra MENTE EM PEDAÇOS é uma curva bem acentuada. Caminho, mas ainda não vejo o que parece estar logo ali, no entanto, ainda escondido.

ENSAIO

O rio seco por onde caminho arranca lágrimas do meu corpo. Chego a sentir novamente o cheiro da umidade das beiras.Talvez, alucinação. Joelhos rendidos em barro escorregadio atestam lucidez. A pele do rio verte entre meus dedos. Aperto bem forte, tento moldar, mas ela escapa. Uma só pele, um só órgão, muitas criaturas frágeis. Criaturinhas fantásticas, efêmeras, fugazes. Minha própria mente em pedaços.

OBRA

Então,  a obra MENTE EM PEDAÇOS carrega tudo isso, menos referências literárias e mais sentimentos que não consigo escrever.

Dessa vez não cobri nada com barro, não há nada por baixo dessa terra. As formas não foram sequer modeladas pela pressão da angústia de minhas mãos. Será? Eu encontrei essas criaturinhas assim, pontinhas, habitando parte do meu ser. Elas são o que eu sou, quase um autorretrato,  quase um reflexo.

Essa obra é como minha mente, extremamente frágil, fugaz e efêmera. Justamente por isso o barro não foi queimado ou esmaltado. Eu precisava manter essa instabilidade e possibilidade de transformação. Cacos e pó vão virar barro de novo. Digo isso com muita tranquilidade porque nasci no Planalto Central, adaptada a longas secas e sei que a chuva não falha… eu sei que a água vai jorrar e transbordar. E tudo poderá ganhar novas curvas

Memorial descritivo: Massa cerâmica Pascoal na cor terracota. Sem queima.

Spoiler: tem outra obra com o desdobramento textual deste processo, deste ensaio.