Era pra ser um texto sobre a exposição, mas virou um texto sobre o que a arte faz com as pessoas

Brasília, 30 de março de 2023. Estive na abertura da exposição hoje à noite. Eu sabia que seria impactante, não tinha como não ser. Estava planejando escrever mil coisas sobre a mostra PEDRO, uma retrospectiva do artista Pedro Ivo Verçosa, com curadoria de Ralph Guere – bem no coração de Brasília, ocupando o salão principal do Museu Nacional da República. Mas me silencio. Eu não estava preparada para tanto! 

As obras de Pedro já são impactantes sozinhas, é como se as pinceladas escuras, ou sobreposição de transparências, tivessem muita energia condensada. Juntas, criaram uma força descomunal que preencheu todo aquele vão do monumento público como se fosse o turbilhão de uma cachoeira na cheia. Não estava cabendo! Os presentes – e eram muitos. Poucas vezes vi o Museu tão cheio – estavam revirados com aquela potência que se misturava com saudades, memórias e afetos.

Eu não conheci Pedro. Eu nunca estudei com Pedro. Eu nunca tomei uma cerveja com Pedro. Eu nunca vi Pedro pintando. Eu nunca dividi ateliê com o Pedro. Nunca fui pintada por Pedro. Nunca fui afeto de Pedro. Mas, durante a abertura da exposição, vi todas essas histórias gritando em abraços apertados, brilhando em olhos mareados e escorrendo pelas faces de amigos, familiares, conhecidos e admiradores. 

Não estou exagerando. A reação recorrente das pessoas ao entrar naquele salão era parar, deixar os olhos passearem com encantamento e respirar fundo para resgatar o fôlego antes de seguir. Era alí, logo nos primeiros passos, que as lágrimas começavam a rolar. E breves conversas pescadas pelo meio da visita ainda ecoam no meu peito: “Tá osso, véi!”, “Já me emocionei várias vezes”, “Eu tenho um quadro desses pequenos”, “Vi o Pedro fazendo tantas coisas”, “Tá difícil”, “Fico lembrando, parece que está tudo vivo na minha cabeça”, “Ele está vivo aqui”. 

Neste momento, não consigo dizer nada sobre as mais de quatrocentas obras expostas. Escrevo, agora, apenas pelo exercício da escrita, tentando me esvaziar um pouco de tudo o que as lágrimas de outras pessoas me encheram.

Talvez, retome o tema em outro momento. Talvez, não.

Meu amigo Pedro

Agora, tentando trazer o tom de celebração que a noite teve, vou dar o play na única música possível enquanto me arrumo para deitar: “Meu amigo Pedro”, na voz de Raul Seixas:

Muitas vezes, Pedro, você fala

Sempre a se queixar da solidão

Quem te fez com ferro, fez com fogo, Pedro

É pena que você não sabe não

Vai pro seu trabalho todo dia

Sem saber se é bom ou se é ruim

Quando quer chorar vai ao banheiro

Pedro as coisas não são bem assim

Toda vez que eu sinto o paraíso

Ou me queimo torto no inferno

Eu penso em você meu pobre amigo

Que só usa sempre o mesmo terno

Pedro, onde cê vai eu também vou

Pedro, onde cê vai eu também vou

Mas tudo acaba onde começou

Tente me ensinar das tuas coisas

Que a vida é séria, e a guerra é dura

Mas se não puder, cale essa boca, Pedro

E deixa eu viver minha loucura

Lembro, Pedro, aqueles velhos dias

Quando os dois pensavam sobre o mundo

Hoje eu te chamo de careta, Pedro

E você me chama vagabundo

Pedro, onde cê vai eu também vou

Pedro, onde cê vai eu também vou

Mas tudo acaba onde começou

Todos os caminhos são iguais

O que leva à glória ou à perdição

Há tantos caminhos tantas portas

Mas somente um tem coração

E eu não tenho nada a te dizer

Mas não me critique como eu sou

Cada um de nós é um universo, Pedro

Onde você vai eu também vou

Pedro, onde cê vai eu também vou

Pedro, onde cê vai eu também vou

Mas tudo acaba onde começou

É que tudo acaba onde começou

Pedro, meu amigo Pedro

SERVIÇO

Exposição:  “PEDRO — Retrospectiva Pedro Ivo Verçosa”

Curadoria: Ralph Tadeu Gehre

Visitação: até 4 de junho, de terça a domingo, das 9h às 18h30

Onde: Museu Nacional da República, Galeria Principal.

Endereço: Esplanada dos Ministérios – Brasília

Entrada franca

Livre para todos os públicos

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4 Responses

  1. Gratissimo pela linda resenha emocionante. Sua leitura da exposicao é muito propícia e confirma minhas intencoes com a curadoria. Que medmk quem nao o conheceu se identifique, nabpintura e na emoção. Muito obrigado

  2. Obrigado. Nossa intenção foi de não só mostrar a obra de Pedro, queríamos mostrar também o Pedro, o artista, a pessoa, sua gentileza, sua capacidade de doação. Lendo sua escrita, sinto que conseguimos. Obrigado novamente.

    Pai do Pedro.

  3. Bia, Triz, esse foi o primeiro de tantos que li, depois de um inverso longo e duradouro de 45 dias, e me emocionei. Sua sensibilidade já conheço de outros carnavais, mas passsear com você em uma exposição foi inédito. Foi um belo início de despertar para mim.
    Quero outros passeios.

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